Consulta Pública do Edital de Licitação de STFC

Consulta Pública do Edital de Licitação de STFC

Com proximidade do encerramento da vigência dos contratos de concessão de telefonia fixa em regime público em dezembro de 2025, o Conselho Diretor da ANATEL, em sua reunião realizada em 03/08/2023, aprovou por unanimidade a proposta de Consulta Pública sobre a minuta de novo Edital de concessões de STFC com início de vigência de seus contratos em janeiro de 2026. Tendo a relatoria do Conselheiro Moisés Moreira, a consulta pública sobre a proposição de Edital de Licitação ficará aberta para o recebimento de contribuições do público em geral, por 45 dias, encerrando-se em 25/09/2023.

Contexto Atual das Concessões de STFC

De antemão, destacamos que a proximidade do encerramento dos contratos de concessão provocou a ANATEL a estabelecer um prazo às atuais concessionárias para que se manifestem sobre a vontade de realizar a migração para o regime privado de autorização. Esse novo modelo de telecomunicações é previsto desde a edição da Lei nº 13.879/2019.

Em março deste ano, o Tribunal de Contas da União (TCU) determinou à ANATEL o recálculo dos valores a serem empregados pelas prestadoras, inicialmente fixados em R$ 22,6 bilhões, para a adaptação das concessões de STFC para o modelo de autorização. Segundo a decisão do TCU, objetiva-se que a ANATEL evite “utilizar valores que sejam significativamente discrepantes da efetiva valoração de mercado desses bens”, notadamente os bens reversíveis. Após a revisão dos valores pela ANATEL, com a publicação da decisão no Diário Oficial da União em 25/07/2023, passou a correr o prazo de 120 dias para a manifestação das concessionárias.

Nos termos da Lei nº 13.879/2019, regulamentada pelo Decreto nº 10.402/2020, as atuais concessionárias terão a possibilidade de solicitar a migração da concessão para a autorização até 22/11/2023, o que implica dizer que poderão deixar de ter obrigações de universalização, que proporciona o acesso irrestrito e indiscriminado aos serviços de telecomunicações, e de continuidade, que assegura a permanente fruição dos serviços de telecomunicações por seus usuários. Para a migração far-se-á necessário, no entanto, o pagamento referente ao saldo das concessões avaliado em R$ 33,6 bilhões, isso se somando os valores das 5 concessionárias: Telefônica, Oi, Claro, Algar Telecom e Sercomtel.

O valor do saldo para a adaptação é calculado de acordo com os 6 principais vetores discriminados no Manual Metodológico da ANATEL: saldo constituído por desonerações de obrigações decorrentes de alterações contratuais anteriores (A1) e de potenciais alterações contratuais futuras (A2); saldo da desoneração do ônus bienal do STFC (B1) e saldo da desoneração do Fator X (B2); valor real dos bens reversíveis na data da Adaptação (C1) e valor da exploração do STFC na data da Adaptação (C2). O próprio Manual já passou pela avaliação do TCU , tendo sido determinada a adequação do vetor C1, conforme indicado anteriormente.

Ainda nesse contexto, Telefônica, Oi e Claro apresentaram processos de arbitragens na Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional (CCI) relativos à matéria de equilíbrio financeiro nos contratos de concessão de STFC, que se encerram em 31 de dezembro de 2025.

Nos casos da Telefônica e Oi, cujos valores dos litígios são R$ 10 bilhões e R$ 16 bilhões respectivamente, as empresas alegam que, ao longo dos mais de 20 anos de concessão, o STFC passou a enfrentar grave crise, tendo resultado em diminuição acentuada do número de usuários, acompanhada pela redução das receitas das concessionárias. Esse processo, na visão das concessionárias, deve-se ao fato das “drásticas e imprevisíveis evoluções tecnológicas e do mercado consumidor”, que, por sua vez, tornaram a concessão economicamente inviável ao proporcionar elevados prejuízos às prestadoras.

Para além dos eventos mencionados, também foram indicados a insustentabilidade econômica do contrato de concessão; a controvérsia sobre o saldo, em favor da União, em decorrência de desonerações de obrigações constantes do Plano Geral de Metas para a Universalização do Serviço Telefônico Fixo Comutado prestado no Regime Público (PGMU) e a controvérsia sobre cláusulas contratuais que impõem às concessionárias o pagamento de indenizações por reversão de bens necessários à concessão do STFC.

Por essa razão que, como adiantado pelo Conselheiro Arthur Coimbra ainda no final de 2022, o novo Edital não prevê a reversibilidade de bens, tornando a concessão “mais atrativa e à prova do futuro”, pois, hoje em dia, já existe maior clareza sobre a reversibilidade de bens, podendo configurar uma menor carga regulatória.

Objeto da Licitação

Conforme disposto no Edital, o objeto da licitação é a “concessão do STFC, com neutralidade tecnológica, na modalidade Local, nos municípios classificados como categorias 3 e 4 no mercado de varejo de voz, conforme Plano Geral de Metas de Competição (PGMC) e suas respectivas localidades, e nas localidades dos municípios categorias 1 e 2, onde só haja o STFC em regime público como alternativa de serviço de voz, em 31 de dezembro de 2025”.

Essa delimitação de localidades a serem atendidas pelo objeto do Edital, notadamente as 14.823 localidades, conforme levantamento realizado pela Gerência de Universalização e Ampliação do Acesso (PRUV) indicado na Análise de Impacto Regulatório (AIR), enquadradas nas categorias 1 e 2, somente atendidas por STFC, além das localidades das categorias 3 e 4, reconhecidas como localidades pouco ou não competitivas, deve-se ao fato de a ANATEL entender que este modelo traria maior atratividade, garantindo maior número de interessados em participar da Licitação. A lista final dos municípios será divulgada em 31/12/2025.

Nessa esteira, a ANATEL também justifica, por entender menos atrativo, a exclusão das modalidades de longa distância nacional (LDN) e longa distância internacional (LDI), para além da exclusão da previsão de agregar ao objeto da Licitação a concessão da exploração do direito de passagem dos serviços de telecomunicações na infraestrutura de energia elétrica: exploração do direito de passagem, com exclusividade, da faixa de ocupação em postes de distribuição de energia elétrica. Nas palavras do Conselheiro Moisés Moreira, “o direito de passagem passaria a ser explorado economicamente pelo concessionário do STFC, que repassaria uma parte dos valores à concessionária de energia elétrica titular do poste, como remuneração pelo custo de manutenção dos postes”. O compartilhamento de pontos de fixação em postes tem sido objeto de estudos por parte da ANEEL e ANATEL, no âmbito do Processo 53500.014686/2018-89.

Prazo das Concessões

Segundo o disposto na proposta do Edital, o prazo para vigência dos novos contratos de concessão de STFC seriam fixados em 5 anos, podendo ser prorrogados por igual período apenas uma única vez. Dessa forma, temos que, no máximo a partir de 2037, a exploração do serviço de telefonia fixa obedecerá ao regime privado de autorização.

Nas palavras do Conselheiro Relator Moisés Moreira, em sua Análise nº 44/2023, o ciclo de concessões de STFC poderá ser encerrado em até 10 anos, contudo, nada impede que o encerramento se dê ao final dos 5 anos de vigência previstos nos contratos, logo ainda em 2031, “ou seja, chegado o prazo do vencimento, será feita uma avaliação acerca da conveniência e oportunidade de se prosseguir com o contrato por mais um período, sendo apurada, dentre outros fatores, a necessidade de se manter o STFC em regime público”.

Áreas de Outorgas e Lotes

Serão 8 lotes, distribuídos pelas mesmas 7 áreas de outorgas identificadas no Edital de Licitação do 5G, ocorrido no final de 2021: (i) Norte, (ii) Nordeste, (iii) Centro-Oeste, (iv) Sul, (v) Rio de Janeiro-Espírito Santo-Minas Gerais, (vi) Estado de São Paulo, (vii) Grupo de cidades de Goiás e Mato Grosso do Sul e Grupo de cidades de São Paulo e Minas Gerais.

De acordo com o Conselheiro Moisés Moreira, poderá haver mudança na distribuição de lotes a partir do recebimento de contribuições por meio da Consulta Pública, podendo realizar o “casamento” entre regiões, por exemplo, ao se juntar a Região Norte e o Estado de São Paulo em um único lote.

Compromissos de Atendimento

Para os compromissos de atendimento, da Análise de Impacto Regulatório – AIR, foi identificada como mais adequada a alternativa que prevê impor obrigações de Acesso individual em localidades (classes residencial, não residencial e tronco), Acesso individual em áreas rurais, Acesso coletivo (Telefone de Uso Público – TUP), conforme estabelecido no PGMU V; manutenção da infraestrutura de rede de suporte do STFC para conexão em banda larga (backhaul), prevista no PGMU V.

Demais Compromissos do PGMU

Quantos aos compromissos assumidos pelos vencedores da Licitação, em linhas gerais, serão os mesmos do atual Plano Geral de Metas de Universalização – PGMC V (Decreto nº 10.610/2021), à exceção de alguns ajustes, como indicado na Análise nº 44/2023:

  • Inclusão do Fust, como fonte de financiamento complementar;
  • Definição da área de abrangência como as áreas sem competição adequada, nos termos da regulamentação da Anatel;
  • Exclusão do AICE;
  • Remoção das disposições relativas a backhaul, haja vista que as obrigações de backhaul constaram do Edital do 5G, como compromissos dos vencedores daquele certame;
  • Exclusão do sistema de acesso fixo sem fio;
  • Exclusão das concessionárias de LDN e LDI e de suas obrigações, dado que tais modalidades de STFC passarão a ser prestadas exclusivamente no regime privado.

Financiamento dos Compromissos

Também sob o argumento de tornar o Edital de Licitação mais atrativo, a ANATEL inova ao possibilitar a utilização de recursos do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações – FUST para a própria subvenção da exploração do serviço. Assim, o FUST seria mais uma forma de remuneração pela prestação do serviço ao lado da usual cobrança da tarifa.

Ressalva-se que a ANATEL identifica áreas deficitárias, em que os custos da operação são mais altos do que os valores recebidos pelas concessionárias a título de contrapartida pela prestação do serviço. É justamente nessas áreas que o FUST poderia ser utilizado.

Quem pode participar e critérios para vencer a Licitação

Preenchendo os requisitos previstos no item 4 “Condições de Participação” do Edital, tanto as atuais concessionárias de STFC, quanto novas prestadoras nacionais ou estrangeiras poderão participar da Licitação.

Contudo, o item 4.2, à luz do Art. 90, LGT, chama a atenção por proibir a participação na licitação de empresa que tenha sido punida nos últimos 2 anos com a decretação de caducidade de concessão. Este é um ponto de atenção à Oi, que teve processo de caducidade de concessão instaurado pela ANATEL ainda em maio deste ano.

Vencerá a licitação aquela prestadora que propuser o menor valor a ser utilizado do FUST destinado a cobrir os investimentos e custos decorrentes do Edital. Em havendo empate, outros critérios serão utilizados para a determinação dos vencedores.

A quantidade de manifestações à essa consulta pode ser um sinalizador do apetite e interesse do mercado nesse novo modelo de exploração do serviço STFC. Seguiremos acompanhando.

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Gabriella Salvio – gabriella.salvio@soutocorrea.com.br
Raphael Abreu Borges – raphael.borges@soutocorrea.com.br

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