Publicada MP sobre o novo marco da securitização

Publicada MP sobre o novo marco da securitização

Com o objetivo de fortalecer o mercado de capitais e o mercado de crédito, o Governo Federal editou, em 15 de março de 2022, a Medida Provisória nº 1.103 (MP), que dispõe sobre (i) a emissão de Letra de Risco de Seguro (LRS) por meio de Sociedade Seguradora de Propósito Específico (SSPE), (ii) as regras gerais aplicáveis à securitização de direitos creditórios e à emissão de Certificados de Recebíveis (CR) e (iii) a flexibilização do requisito de instituição financeira para a prestação do serviço de escrituração e de custódia de valores mobiliários.

Emissão de LRS por meio de SSPE

A MP criou a LRS, título de crédito nominativo, transferível e de livre negociação, representativo de promessa de pagamento em dinheiro, vinculado a riscos de seguros e resseguros, de emissão exclusiva da SSPE.

A SSPE é a sociedade seguradora que tem como finalidade exclusiva realizar operações de aceitação de riscos de seguros, previdência complementar, saúde suplementar, resseguro ou retrocessão, originadas por contrapartes, por meio da emissão de LRS para financiamento no mercado de capitais.

De acordo com a MP, são consideradas contrapartes, que poderão ceder riscos à SSPE: a sociedade seguradora, o ressegurador, a entidade de previdência complementar e a operadora de saúde suplementar.

A SSPE não responderá diretamente perante o segurado, participante, beneficiário ou assistido pelo montante assumido quando a contraparte for sociedade seguradora, ressegurador, entidade de previdência complementar ou operadora de saúde suplementar, hipótese em que a contraparte ficará integralmente responsável pela indenização, exceto na hipótese de insolvência, de decretação de liquidação ou de falência, quando será permitido o pagamento direto ao segurado, participante, beneficiário ou assistido da parcela da indenização ou benefício correspondente à cessão do risco à SSPE (desde que o pagamento da parcela não tenha sido realizado pela contraparte ou à própria contraparte).

Os recursos captados por meio da emissão da LRS, em conjunto com os prêmios, deverão corresponder, no mínimo, ao valor nominal total da perda máxima possível decorrente dos riscos de seguros e resseguros, acrescidos de despesas, e serão destinados exclusivamente para a cobertura de tais riscos e cumprimento de obrigações representadas na LRS. A LRS deve possuir relação paritária com os riscos aceitos pela SSPE, que devem ser, integralmente e no mesmo montante, cobertos pela LRS emitida.

Os contratos de transferência de risco da contraparte para a SSPE, assim como a LRS, deverão garantir que a transferência de risco seja efetiva em todas as circunstâncias. Os direitos dos investidores titulares das LRS estarão subordinados às obrigações decorrentes do contrato de cessão de riscos à SSPE.

As obrigações representadas pela LRS serão extintas pela inexistência de riscos a decorrer, sinistros a pagar e recursos a serem devolvidos aos seus titulares.

Cada operação de aceitação de riscos de seguros e resseguros por meio da emissão de LRS será independente patrimonialmente em relação às demais operações realizadas pela mesma SSPE e à própria SSPE. Nesse sentido, o patrimônio independente constituído para cada operação não será alcançado pelos efeitos da decretação de intervenção, liquidação extrajudicial ou falência da SSPE e não integrarão a massa concursal.

O patrimônio de cada operação incluirá a parcela do prêmio repassado pela contraparte não destinado à remuneração da SSPE e: (i) não poderá ser utilizado para o pagamento de obrigações relativas a outras operações da SSPE; (ii) será destinado exclusivamente à liquidação das LRS e ao pagamento de sinistros, custos de administração e obrigações fiscais; (iii) não responderá perante os credores da SSPE por qualquer obrigação; (iv) não será passível de constituição de garantias por quaisquer dos credores da SSPE, por mais privilegiados que sejam; e (v) somente responderá pelas obrigações inerentes às LRS a ele afetadas.

A MP entrou em vigor em 16 de março de 2022, mas o mercado deverá aguardar, para formalizar a emissão de LSR, a edição de normas pelo Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), pela Superintendência de Seguros Privados (Susep) e pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), assim como pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) no tocante à oferta pública de distribuição da LSR.

Regras gerais aplicáveis à securitização de direitos creditórios e à emissão de Certificados de Recebíveis

A MP trouxe ainda regras gerais aplicáveis à securitização de direitos creditórios, com a criação de uma definição legal de operações de securitização: “são consideradas operações de securitização a emissão e a colocação de valores mobiliários junto a investidores, cujo pagamento é primariamente condicionado ao recebimento de recursos dos direitos creditórios que o lastreiam”.

De acordo com a MP, as companhias securitizadoras são instituições não financeiras constituídas sob a forma de sociedade por ações, que têm por finalidade a aquisição de direitos creditórios e a emissão de Certificados de Recebíveis ou outros títulos e valores mobiliários representativos de operações de securitização

A MP criou também os Certificados de Recebíveis, títulos de crédito nominativos, emitidos de forma escritural, de emissão exclusiva de companhia securitizadora, de livre negociação, e que constituem promessa de pagamento em dinheiro.

Abaixo seguem as principais inovações trazidas pela MP.

Natureza dos Direitos Creditórios: A MP estendeu às companhias securitizadoras a possibilidade de realizar operações de securitização envolvendo direitos creditórios de qualquer natureza, podendo ser voltado aos demais setores da economia. Assim, sociedades de outros setores, que não o imobiliário e o agronegócio, que antes contavam apenas com a possibilidade de securitização por meio da estruturação de fundos de investimento em direitos creditórios (FIDC), agora poderão securitizar seus recebíveis por meio de CR.

Variação cambial: O CR poderá ser emitido com cláusula de correção pela variação cambial, desde que seja integralmente vinculado a direitos creditórios com cláusula de correção na mesma moeda e seja emitido em favor de investidor residente ou domiciliado no exterior (o que até o momento era permitido apenas para Certificados de Recebíveis do Agronegócio), observado que o Conselho Monetário Nacional (CMN) poderá estabelecer outras condições para a emissão de CR com cláusula de correção pela variação cambial.

Emissão em diferentes classes e séries e complementação de lastro: De acordo com a MP, será possível a celebração de aditamento ao termo de securitização para inclusão de novas classes e séries e requisitos de complementação de lastro.

Revolvência: A MP estabeleceu que as operações de securitização poderão contar com a possibilidade de substituição ou aquisição futura dos direitos creditórios vinculados aos CR com a utilização dos recursos provenientes do pagamento dos direitos creditórios originalmente vinculados à emissão. A estrutura da revolvência é atualmente admitida para as operações de securitização envolvendo Certificados de Recebíveis do Agronegócio.

Chamadas de capital: A companhia securitizadora poderá celebrar com investidores promessa de subscrição e integralização de CR, de forma a receber recursos para a aquisição de direitos creditórios que servirão de lastro para a sua emissão, conforme chamadas de capital feitas de acordo com o cronograma esperado para a aquisição dos direitos creditórios.

Regime fiduciário: A companhia securitizadora poderá se beneficiar da instituição de um regime fiduciário sobre os direitos creditórios e sobre os bens e direitos que sejam objeto de garantia em favor do pagamento dos CR ou de outros títulos e valores mobiliários representativos de operações de securitização e, se houver, do cumprimento de obrigações assumidas pelo cedente dos direitos creditórios.

Dação em pagamento: A MP permitiu a possibilidade de pagamento dos CR ou de outros títulos e valores mobiliários representativos de operações de securitização mediante a dação em pagamento dos direitos creditórios vinculados à operação.

Ofertas públicas: A Instrução da CVM n° 400, que regula as ofertas públicas registradas na CVM, não possui um rol taxativo de valores mobiliários e, portanto, já seria admitida a oferta pública de CR realizada por uma companhia securitizadora registrada como emissor de valores mobiliários ou nos termos da Resolução da CVM nº 60. No entanto, a Instrução da CVM nº 476, que regula as ofertas públicas com esforços restritos, possui um rol taxativo de valores mobiliários que podem ser emitidos, incluindo apenas os Certificados de Recebíveis Imobiliários e Certificados de Recebíveis do Agronegócio. Para que seja possível realizar uma oferta pública restrita de CR será necessário aguardar uma eventual alteração à Instrução da CVM nº 476. Importante destacar que, no momento, também seria possível realizar operações de securitização envolvendo com outros títulos e valores mobiliários tais como debêntures ou notas comerciais.

Tributação: Os rendimentos dos CR não serão isentos do imposto sobre a renda incidente sobre os rendimentos pagos a pessoas físicas, aplicando-se aos CR as regras de tributação aplicáveis a títulos de renda fixa (diferentemente do que ocorre com os CRI e CRA).

Flexibilização do requisito de instituição financeira para a prestação do serviço de escrituração e custódia de valores mobiliários

A MP alterou o artigo 293 da Lei das Sociedades por Ações de forma a autorizar que entidades que não sejam instituições financeiras prestar serviços de custódia de valores mobiliários.

Entendemos que a MP trará muitas vantagens para os mercados de capitais e de seguros e está alinhada com práticas dos mercados internacionais.

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