Advogados pedem ao governo flexibilizações trabalhistas no Rio Grande do Sul

Empresas e trabalhadores estão tentando que encontrar saídas para sobreviver à tragédia que acomete o Rio Grande do Sul e há um dispositivo legal que poderia auxiliar no processo. O Governo Federal criou, na pandemia, uma lei que “padronizou” medidas trabalhistas passíveis de serem tomadas durante estados de calamidade pública: teletrabalho sem alteração de contrato, antecipação de férias coletivas ou individuais, antecipação de feriados, compensação de banco de horas em até 18 meses e suspensão do recolhimento do FGTS. O problema é que, para serem aplicadas, as medidas precisam de regulamentação específica por parte do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

Sem o ato do Ministério, as mudanças ficam submetidas a negociações coletivas intermediadas pelos sindicatos, explicam advogados ouvidos pelo Broadcast. “Estamos conseguindo algumas negociações, mas o problema é que muitos sindicatos nem respondem, pois estão sem condições”, relata Benôni Rossi, sócio-diretor do RMMG Advogados e chefe da área trabalhista do escritório.

“Se a regulamentação por parte do MTE viesse, poderíamos ser mais diretos”, defende. Segundo a lei 14.437/2022, a Pasta deve, ao regulamentar o tema, estabelecer um prazo durante o qual as medidas alternativas ficarão vigentes, por se tratar de algo emergencial. O Ministério do Trabalho e Emprego foi questionado pela reportagem a respeito da intenção ou não de emitir algum ato normativo sobre o assunto, mas não retornou até a publicação da matéria.

O que já foi feito

Na quarta, 15, o governo federal publicou uma portaria que autorizou a suspensão do recolhimento do Fundo de Garantia do FGTS pelos empregadores de 46 municípios gaúchos considerados em estado de calamidade pública. A portaria suspendeu o recolhimento referente aos meses de abril, maio, junho e julho.

Além de suspender a obrigatoriedade do recolhimento do FGTS, foram liberadas mais duas parcelas adicionais do seguro-desemprego para quem já estava recebendo o benefício, e o pagamento do abono salarial para moradores do Estado foi antecipado. A Caixa Econômica Federal também anunciou a liberação do saque do FGTS por calamidade, que permite retirar até R$ 6.220,00, limitados ao saldo disponível.

Flexibilização tributária

No âmbito tributário, os governos federal e estadual também flexibilizaram normas. A Receita Federal prorrogou os prazos para recolhimento dos impostos federais com vencimento em abril, maio e junho para o último dia útil dos meses de julho, agosto e setembro, respectivamente. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) também aumentou os prazos para pagamento de parcelas decorrentes de programas de negociação de dívida.

O período para quitação de guias do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) no Estado foi igualmente estendido, e foi criado um “corredor humanitário” para a dispensa de apresentação de notas fiscais relativas a doações destinadas às áreas afetadas. A decisão foi tomada em reunião extraordinária do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz).

O Broadcast apurou que há, no Congresso Nacional, uma discussão sobre a possibilidade de haver um “pacote” de medidas tributárias, a exemplo da lei que padronizou as medidas emergenciais trabalhistas que podem ser tomadas em caso de calamidade. A elaboração do projeto estaria a cargo do deputado Luiz Gastão (PSD-CE). Fontes ligadas ao parlamentar confirmaram que há uma proposta “em fase de finalização” e que, entre outros assuntos, está o que trata da tributação.

Anderson Trautman, sócio do Souto Correa Advogados na área Tributária, explica que, hoje, vários atos normativos da Receita e da Fazenda permitem a edição de normas emergenciais, mas que a unificação das medidas em um “pacote” poderia trazer agilidade. “Com a pressuposição do estado de calamidade, ter esse arcabouço legislativo para questões tributárias poderia ajudar”, diz.

Trautman ainda questiona os prazos estipulados pelo Fisco, mencionando que a prorrogação de até três meses para as obrigações tributárias parece insuficiente diante das consequências do desastre.

Rafael Maffini, sócio-diretor do RMMG Advogados e diretor da área de Direito Público e Regulatório, endossa a necessidade de medidas que mitiguem os impactos econômicos no Rio Grande do Sul. “Agora é o momento de salvar vidas. Mas, na sequência, sabemos que precisaremos reerguer o Estado”, defende.

* Reportagem escrita por Carolina Maingué Pires, originalmente veiculada pelo Broadcast, do Grupo Estado, em 17/05/2024.

Sou assinante
Sou assinante